4 de maio de 2025

Sonhos lúcidos e alta inteligência: uma manifestação de eficiência neural

Este texto foi escrito por um colunista do TecMundo; saiba mais no final.

O recente estudo do Centro Donders de Neuroimagem Cognitiva, publicado no Journal of Neuroscience, estabelece uma nova compreensão sobre o sonho lúcido. Trata-se de um estado distinto de consciência, caracterizado pela ativação coordenada de regiões específicas do cérebro, como o lobo central direito, o lobo parietal e o pré-cúneo. Este achado conduz a uma reflexão inevitável: seria o sonho lúcido mais acessível a cérebros de alta inteligência?

A resposta encontra fundamento na observação de que a arquitetura neural de indivíduos com coeficiente intelectual elevado, sobretudo aqueles com desenvolvimento de amplas regiões de interferência intelectual (DWRI), favorece a interconexão eficiente entre áreas do cérebro responsáveis pelo raciocínio abstrato, pela memória não verbal e pela consciência espacial. O conceito de DWRI propõe que a inteligência real decorra da integração funcional entre diversas redes cognitivas e emocionais, superando as métricas convencionais.

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A experiência do sonho lúcido não se restringe a uma anomalia do sono REM. (Fonte: Getty Images)

O QI, embora seja uma medida importante e válida, é relativo ao contexto da eficiência cerebral observado. Em cérebros DWRI, há predominância de padrões de ativação que envolvem ondas beta e gama, associadas ao pensamento consciente, à atenção sustentada e à capacidade de autorreflexão. Essas mesmas ondas estão presentes em níveis elevados durante os sonhos lúcidos, conforme revelado pelas análises de eletroencefalografia.

A experiência do sonho lúcido não se restringe a uma anomalia do sono REM, mas representa a capacidade do cérebro de manter a autoconsciência em um ambiente de processamento sensorial reduzido. Esta capacidade é coerente com a habilidade metacognitiva avançada encontrada em pessoas de alta inteligência. Durante o sonho lúcido, o processamento autorreferencial no pré-cúneo é mantido ou até amplificado, criando condições para controle e manipulação da narrativa onírica.

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A capacidade de sonhar lucidamente pode ser interpretada como uma extensão do processo de vigília. (Fonte: Getty Images)

O estudo também aponta para uma semelhança entre os estados neurofisiológicos do sonho lúcido e os estados induzidos por psicodélicos. A diferença fundamental é que no sonho lúcido há preservação da identidade do eu, enquanto nos estados psicodélicos ocorre dissolução do ego. A manutenção da integridade do self, mesmo em estados de percepção alterada, indica uma maior capacidade de organização interna da consciência, algo que exige uma arquitetura neural mais complexa e eficiente.

Em uma perspectiva evolutiva, a capacidade de sonhar lucidamente pode ser interpretada como uma extensão do processo de vigília. O cérebro de alta inteligência, dotado de maior conectividade e de controle executivo superior, seria naturalmente mais propenso a utilizar o estado de sonho lúcido para simulações mentais, reavaliações de cenários e fortalecimento de estratégias cognitivas.

O reconhecimento do sonho lúcido como um novo estado de consciência independente reforça a ideia de que cérebros altamente desenvolvidos apresentam um contínuo de consciência mais amplo. Neste cenário, a inteligência manifesta-se não apenas na vigília, mas também nos processos internos que ocorrem durante o sono.

A compreensão de que a inteligência, embora mensurável pelo QI, não se limita a ele, amplia o conceito de capacidades humanas. O sonho lúcido, em indivíduos de alta inteligência, pode ser compreendido como mais uma expressão natural da eficiência e da complexidade do cérebro.

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Dr. Fabiano de Abreu Agrela Rodrigues, Pós-PhD em Neurociências, é membro da Society for Neuroscience (EUA), Royal Society of Biology e Medicine (Reino Unido), entre outras. Mestre em Psicologia, licenciado em História e Biologia, tecnólogo em Antropologia e Filosofia. Autor de 300 estudos e 30 livros, membro de sociedades de alto QI como Mensa, Intertel, Triple Nine, IIS e ISI. Professor em PUCRS, UNIFRANZ e Santander, diretor do CPAH e criador do projeto GIP.

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