A novela envolvendo a venda da petroquímica Braskem pela Novonor ganhou mais um capítulo – e daqueles do tipo plot twist: a proposta do empresário Nelson Tanure para levar a fatia. Mas, embora as conversas entre as partes envolvidas – acionistas e credores – estejam acontecendo, ainda é muito cedo para acreditar que esse será o desfecho final.
Pessoas que acompanham as negociações ouvidas pelo InvestNews expressam várias dúvidas sobre o negócio, entre elas: a disposição de a Petrobras se associar com o dono da Prio; a viabilidade financeira da operação; e o ‘sim’ dos bancos para um grande desconto na dívida devida pela Novonor.
A proposta de Tanure foi apresentada por meio do fundo Petroquímica Verde e prevê a compra da NSP Investimentos, holding por meio da qual a Novonor controla 50,1% das ações ordinárias (com direito a voto) da Braskem. A Petrobras detém outros 47% desta classe de ações, e os minoritários, 2,9%.
O pulo do gato da oferta de Tanure é que, da forma como foi construída, ela desobrigaria a realização de uma oferta pública de aquisição (OPA) pelas ações dos minoritários, exigida em caso de mudança de controle direta. No formato proposto, em vez da transferir as ações da Braskem para Tanure, a Novonor venderia a participação da holding. A OPA é sempre um risco de fazer com que o valor da transação fique mais alto.
O problema é que as ações que a Novonor quer vender estão nas mãos dos bancos credores – Itaú, Bradesco, Santander, Banco do Brasil e BNDES —, porque foram dadas como garantia de uma dívida da Novonor, quando ainda era Odebrecht, avaliada hoje em mais de R$ 15 bilhões. A Braskem hoje tem um valor de mercado de aproximadamente R$ 9,4 bilhões. E a Novonor é dona de 38,3% do capital total da companhia (ações preferenciais e ordinárias), um valor estimado hoje em R$ 3,6 bilhões.
O negócio só fará sentido, portanto, se credores aceitarem entregar as ações com um desconto muito grande dessa dívida. Em um cenário super otimista, de um hair cut (desconto) de 50%, a dívida a ser paga seria de R$ 7,5 bilhões, ainda bem acima do valor do lote de ações.
Tanure é conhecido por fazer operações arriscadas: compra empresas em crise financeira, algumas em recuperação judicial. Conduz o chamado turnaround para colher os frutos dessa reestruturação anos depois – seja vendendo sua participação com lucro, seja recebendo bons dividendos.
Seu negócio de maior sucesso foi a PetroRio, hoje Prio. Mas quem acompanha a trajetória do empresário observa que, hoje, há ativos muito desafiadores na carteira do empresário, como é o caso da Light, comprada por Tanure em 2023 e que tem uma dívida estimada em mais de R$ 15 bilhões e que hoje enfrenta uma recuperação judicial.
De todo modo, segundo fontes que acompanham as conversas, Tanure já começou a fazer a due diligence confirmatória – quando o potencial comprador analisa documentos da empresa que deseja comprar, para confirmar como está a situação financeira.
Mas ainda não teve o apoio dos bancos: a proposta do empresário foi articulada sem o aval dos credores, rompeu o fluxo das tratativas e, com isso, aumentou a tensão entre as partes. Para os bancos, o gesto foi interpretado como uma tentativa da Novonor de manter influência na Braskem — mesmo sem condições financeiras de fazê-lo.
Plano frustrado
A proposta de Tanure acabou de certa forma suspendendo uma outra negociação que tinha se iniciado cerca de um mês antes: a possibilidade de trazer a IG4 Capital, gestora especializada em reestruturação de empresas, como sócio de referência.
O IG4 chegou para ocupar o lugar da Geribá, gestora com foco em liquidação e venda de ativos. A Geribá havia sido escolhida pelos bancos para capitanear uma outra solução que havia sido desenhada para a Braskem: a criação de um fundo, composto pelas ações da Braskem que pertencem à Novonor e que hoje estão nas mãos dos bancos credores.
A ideia era que a Geribá fizesse a gestão desse fundo de forma que os bancos pudesse se desfazer de suas posições no momento em que os papéis recuperassem valor. O acordo com a Geribá acabou não avançando por causa de conflitos de interesse da gestora com a Petrobras.
Foi nesse contexto que os bancos procuraram a IG4, especializada em reestruturação de empresas — e com histórico em processos como o da Iguá Saneamento. Segundo fontes próximas à companhia, a substituição marcou uma mudança de rota: em vez de buscar apenas uma saída rápida, os bancos passaram a considerar um plano de turnaround mais profundo e de longo prazo — com reorganização da governança, capitalização e solução para os principais passivos.
Nesse novo desenho, a realização de uma OPA pelas ações ordinárias deixou de ser tabu. Hoje, o custo estimado para comprar as ações ON dos minoritários é de cerca de R$ 155 milhões — valor considerado administrável diante do potencial de valorização da companhia. No entanto, esse caminho só seria considerado se a Petrobras permanecesse como acionista.
A avaliação entre interlocutores próximos ao processo é que, mais do que evitar a OPA, o que importa agora é apresentar um plano crível, com governança clara, previsibilidade financeira e respaldo da Petrobras.
E a Petrobras?
A Petrobras será peça fundamental para qualquer desfecho: seja a solução dos bancos, seja a chegada de Tanure.
Sabendo disso, a estatal quer aproveitar o momento para renegociar seu acordo de acionistas. Fontes próximas à empresa disseram à Reuters que a companhia se sente sub-representada na Braskem e pretende rever os termos.
Mesmo com 47% dos votos, a petroleira ocupa hoje apenas quatro das 11 cadeiras no conselho de administração e indica um único diretor executivo. Com a gestão de Magda Chambriard, a Petrobras reforçou seu interesse em ter mais voz na definição do futuro da Braskem, sem necessariamente ampliar sua participação na companhia.
Pessoas próximas aos bancos credores demonstram disposição em renegociar o papel da Petrobras na estrutura de governança.


Na segunda-feira (26), Magda classificou a proposta de Tanure como “um passo na direção certa”, mas sinalizou que o ativo exige soluções com base em diálogo institucional — não em movimentos isolados. “A Braskem tem uma relevância estratégica e não podemos largar a petroquímica de jeito nenhum”, disse Magda, durante evento no BNDES, no Rio de Janeiro.
Para parte do mercado, a Petrobras tende a ter um papel de “fiadora moral” de qualquer solução que busque resgatar a credibilidade da Braskem. Sem o aval — ainda que informal — da estatal, dificilmente um novo controlador conseguirá ancorar uma reestruturação sólida.
Desde o fracasso das negociações com a Adnoc e outras potenciais compradoras, como LyondellBasell, Unipar e J&F, havia um entendimento de que a saída passaria por uma gestão compartilhada entre os bancos, ancorada por um novo grupo com o apoio da Petrobras.
A Braskem já perdeu cerca de R$ 60 bilhões em valor de mercado desde 2017. A companhia acumula passivos ambientais relevantes — como o caso de Alagoas, que gerou R$ 18 bilhões em indenizações — e enfrenta o pior ciclo da petroquímica em anos. Ainda assim, permanece como a maior produtora de resinas da América Latina e uma das principais alavancas da cadeia industrial brasileira.
Proposta de Tanure
Pelos termos do acordo, Tanure ficaria com cerca de 95% da holding NSP, enquanto a Novonor manteria uma participação simbólica, entre 3% e 5%. Segundo o colunista Lauro Jardim, a proposta também incluiria um aporte de US$ 100 milhões no grupo da família Odebrecht.
Em nota pública, Tanure afirmou que seu compromisso é de longo prazo com a Braskem, e que a companhia tem potencial para se tornar “a primeira petroquímica verde do mundo”.
O empresário defendeu uma atuação conjunta com a Petrobras e destacou três frentes prioritárias: resolver o passivo ambiental em Alagoas; transformar o polo de Camaçari (BA) em um centro de inovação; e reforçar a estrutura de capital da empresa.
Para interlocutores do mercado, no entanto, a proposta chegou sem clareza sobre o financiamento, acusam Tanure de não ter liquidez para realizar o negócio – o empresário não retornou ao InvestNews.
Além disso, a ausência de diálogo com os bancos — que souberam pela imprensa do acordo entre Tanure e a família Odebrecht —, além da manutenção da Novonor na estrutura acionária, geraram forte resistência.
Apesar de serem cinco bancos — Itaú, Bradesco, Santander, Banco do Brasil e BNDES —, o grupo atua de forma colegiada, o que pode tornar decisões mais lentas, mas também mais alinhadas.
Por outro lado, a aposta é de que Tanure tentará vencer os credores “pelo cansaço”, ao melhor estilo “se não pode com ele, junte-se a ele”.
Nos próximos três meses, Tanure, bancos e Petrobras vão disputar mais do que o controle da Braskem — vão decidir se a companhia continua parada ou, finalmente, muda de rota.
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